O 1º Tenente Moisés Ceschin, da Polícia Militar do Estado do Paraná (na foto acima junto a crianças guineenses), iniciou sua primeira missão a serviço das Nações Unidas no início do mês de maio. Passados pouco mais de 30 dias, o Tenente Ceschin nos enviou um relato com suas primeiras impressões a respeito da missão e da Guiné Bissau. O texto trás muitas informações aos leitores em geral, mas principalmente aos policiais aprovados nas provas do COTER e que já iniciaram o processo de indicação para missões de paz.
"Após um mês, eu diria que já me ambientei ao lugar e a missão sim. Por ser minha primeira missão, acredito que todo dia se aprende algo novo, é uma experiência profissional única servir a ONU e conhecer sua sistemática no terreno, notadamente nesse país tão assolado pelas disputas políticas e conflitos num passado recente desta jovem democracia.
A UNIOGBIS é uma missão política do DPA (Departament of Political Affairs), e possui uma série de objetivos em várias áreas, dentre as quais a Reforma do Setor de Segurança e Defesa. Trabalho no Setor de Reforma Policial como Police Adviser, que faz parte do Setor de Reforma da Segurança, prestando assistência técnica aos projetos em andamento, conforme o plano de trabalho anual, que estipula metas e objetivos a serem buscados pelo Setor.
Os objetivos estratégicos da missão são: Contribuição para a promoção do diálogo político e da reconciliação nacional, reforçar a capacidade dos setores da sociedade e governo em busca da prevenção e resolução dos conflitos, apoiar o processo de reforma da administração pública, notadamente o setor de segurança, defesa e justiça; assistir as autoridades nacionais no combate ao tráfico internacional de drogas, tráfico de seres humanos e crime organizado; monitorar e assistir as autoridades na coordenação e mobilização dos parceiros internacionais dentro de uma visão holística e continuada para apoio e estabilidade da consolidação da paz no país. As tarefas do nosso setor consistem em aconselhamento técnico, treinamento e monitoramento junto às autoridades governamentais e policiais, realização de seminários, conferências e workshops, planejamento de projetos e relatórios das atividades, e principalmente, gerenciamento e implementação de projetos na área de segurança e atinentes a reforma do setor policial.
Quanto a missão aqui na UNIOGBIS, tinha uma série de dúvidas, e vencido o processo de seleção, entrevista, embarque, muitas só foram sanadas às vésperas da viagem. Por exemplo, é uma missão política e não executiva. Logo, não é permitida a vinda com armamento algum. Tive alguns imbróglios no agendamento da viagem, realizada pelo PNUD. Após aconselhamento dos UNPOLS brasileiros aqui presentes, disseram que a melhor escala seria Lisboa - Bissau pela empresa aérea TAP (pela confiabilidade de chegada no horário e destinação das bagagens).
O país possui um potencial muito grande, já foi no passado, antes dos conflitos e enquanto era administrado por Portugal uma referência de desenvolvimento na África Ocidental. Mas após a libertação e conflitos pelo poder envolvendo militares e políticos, hoje há um retrato da destruição.
Encerrou o Tour of Duty do Senior Police Adviser, Coronel PMDF Nelson Werlang Garcia, que já retornou ao país no final de maio, bem como também encerrou o Tour of Duty do Tenente Coronel PMDF Florisvaldo Cesar Ferreira. Ambos os oficiais com impecável conhecimento técnico e importância fundamental dentro do Setor. Meu Induction Training foi com eles, no dia a dia, emitindo suas análises pessoais sobre os problemas existentes. Permanece na missão, representando o Brasil, o Ten Cel MARCOS e Ten Cel Denise, ambos também da PMDF. Vale lembrar que a ajuda "virtual" do Capitão Tales Osório, da BMRS foi providencial, pois me auxiliou muito com informações a respeito do país e dificuldades existentes. Ele é muito bem quisto pelos funcionários da UNIOGBIS e demais colegas da Police Reform Unit, sendo que sempre me indagam se trabalho com ele, pela semelhança dos nossos uniformes. Ele deixou uma ótima impressão, assim como os outros brasileiros.
O nosso setor comporta hoje, 15 vagas para efetivo UNPOL e 3 vagas de Staff, dentre elas a do Senior Police Adviser e duas de Police Project Manager, totalizando 18. Atualmente, encontram-se em aberto a vaga do SPA e duas para efetivo UNPOL. Os países representados no nosso setor são Uruguai (1), Brasil (3), Zimbabwe (1), Moçambique (2), Angola (1), Portugal (1), Espanha (2), Suíça (1), Paraguai (1) e Timor Leste (2). Há a necessidade de expansão do nosso setor, isso é uma certeza, pois a demanda de projetos e objetivos são muito ambiciosos para a atual estrutura. Estamos aguardando a definição do nosso novo Senior Police Adviser, bem como a definição da seleção das outras vagas remanescentes. Sei que há um Coronel da PMDF participando do processo de seleção para essa vaga e estaria cotado para assumir tal posto. Enfim, é algo que precisa ser resolvido o mais rápido possível e uma das necessidades atuais do nosso setor.
Quanto ao idioma de trabalho, ora é português, ora é inglês, sendo que o português é mais falado, por ser a língua oficial do país. Os documentos são realizados principalmente em Inglês. O povo fala português, mas é mais usual a utilização do português creoule, e digo que é muito difícil entender num primeiro momento esta linguagem.
Guiné Bissau é um país muito pobre, de contrastes, mas com extremo potencial. O povo é amistoso e amável e, atualmente, os índices de violência são bem baixos. O nível de desenvolvimento é baixíssimo, péssimos índices de educação e profissionalização o que se reflete na economia: basicamente, os guineenses sobrevivem pela agricultura de subsistência, produção de caju (exportação da castanha) e pesca. A economia informal é muito grande em Bissau, e no interior do país, o retrato é muito mais assolador. O custo de vida é caro, por incrível que pareça, pois a maioria dos produtos são importados.
Questões envolvendo violações dos direitos humanos são freqüentes, principalmente no que concerne a problemática ligada ao Gênero; as mulheres são vítimas de vários absurdos, como mutilação genital e exploração da mão de obra pela característica cultural, religiosa e tradicional do país, além do tráfico de seres humanos, principalmente crianças.
No âmbito técnico, creio eu que seria conveniente uma opinião (entrevista) com os dois oficiais que retornaram, pois ocuparam posições chaves no Setor e possuem uma visão muito mais abrangente da problemática guineense de Bissau. Passei minhas impressões, talvez não sejam as deles... espero ter contribuído para uma visão de como as coisas são por aqui."
1º Ten Moisés Ceschin
UNIOGBIS - 2011